O campo de atuação profissional é de fundamental importância para a autonomia dos indivíduos, para a construção de identidade, para o reconhecimento social, para o acesso a bens de, entre outras dimensões tanto materiais quanto simbólicas, cada vez mais importantes em nossas sociedades neste século XXI. Por isto, as formas como os diferentes grupos populacionais se inserem no mercado de trabalho retrata uma faceta fundamental da desigualdade. Homens, mulheres, brancos e negros apresentam características bem distintas na entrada no mercado de trabalho, nos postos ocupados, nos rendimentos auferidos, nas áreas de atuação, entre outros indicadores abordados neste estudo.
A entrada no mercado de trabalho ocorre mais cedo para os negros e a saída, mais tarde. Os dados de taxa de participação revelam essa característica perversa: apesar de a taxa de participação nas faixas etárias de 10 a 17 anos – que indica a proporção de pessoas ocupadas e desocupadas em relação à população em idade ativa – vir caindo nos últimos 10 anos, o que se confirma em todos os grupos, os maiores indicadores permanecem entre negros e entre jovens do setor rural. De fato, a taxa de participação da população negra de 10 a 15 anos em 2006 era de 15,0%, comparados a 11,6% entre brancos.
Contudo, apesar de entrarem mais cedo no mercado de trabalho, os negros do sexo masculino também estão sobre-representados entre os mais velhos que permanecem ocupados. Entre a população negra com 60 anos ou mais, 34,7% encontravam-se ocupados ou desocupados em 2006, comparados a 29,3% da população branca na mesma faixa etária. Isto é, os negros trabalham durante mais tempo ao longo da vida, entrando mais cedo e saindo mais tarde do mercado de trabalho. Esta característica pode ser explicada pelas formas mais precárias de inserção vividas por esse segmento da população, o que faz com que não tenha garantia de proteção social na velhice, impedindo uma parcela maior de trabalhadores negros de terem acesso à aposentadoria.
As mulheres vêm aumentando sua participação no mercado de trabalho nos últimos anos. Se, em 1996, 46% da população feminina estava ocupada ou à procura de emprego, esta proporção era de 52,6 em 2006 – ainda significativamente inferior à dos homens, de 72,9% no mesmo ano. Entre as causas para o aumento da participação feminina no mercado de trabalho, apontam-se: o aumento da escolaridade feminina, a queda da fecundidade, novas oportunidades oferecidas pelo mercado e, finalmente, mudanças nos padrões culturais, que alteraram os valores relativos aos papéis de homens e mulheres na sociedade. Cabe lembrar, entretanto, que os dados levantados não consideram um trabalho realizado predominantemente pelas mulheres e de fundamental importância para a reprodução da vida e do bem-estar na sociedade: são os afazeres domésticos, que não são contabilizados do ponto de vista
econômico quando não realizados de forma remunerada.
Do ponto de vista regional, chama a atenção a maior participação no mercado de trabalho das mulheres da Região Sul, onde também são verificadas as maiores taxas de ocupação da população feminina. A dificuldade de ter acesso ao mercado de trabalho começa cedo para as mulheres: as jovens de 16 a 17 anos apresentam taxas de ocupação significativamente menores, tanto em relação aos homens quanto em relação às mulheres de outras faixas etárias. Em 2006, somente 68,9% daquelas jovens estavam ocupadas, comparados a 81,3% dos jovens do sexo masculino. Este dado se confirma quando se analisam as taxas de desocupação desses grupos: 31,1% as jovens de 16 a 17 anos estavam desempregadas e somente 18,7 dos jovens estavam na mesma situação. Essas proporções são crescentes ao longo da década para os dois grupos, sendo o maior crescimento, mais uma vez, verificados entre as meninas. A taxa de desocupação – que mensura a proporção de pessoas desempregadas à procura efetiva
de emprego – é um indicador que revela não somente as desigualdades de gênero, mas também as de raça, pois, junto são as mulheres e os negros os que apresentam os maiores níveis de desemprego – 11,0% e 7,1%, respectivamente, comparados a 6,4% entre os homens e 5,7% entre os brancos. As mulheres negras constituem, portanto, o segmento que se encontra em situação mais precarizada, o que se confirma por outros dados, como será visto a seguir.
As informações sobre posição na ocupação também são reveladoras dos diferenciais de gênero e de raça presentes em nossa sociedade: enquanto as mulheres estão mais representadas no trabalho doméstico e na produção para próprio consumo e trabalho não remunerado, os homens ocupam mais postos com carteira de trabalho assinada e de empregador. Se compararmos homens brancos e homens negros, estes enfrentam mais a situação do trabalho sem carteira e também estão mais presentes no emprego doméstico. Destaca-se, ainda, a alta proporção de jovens negras, com idade entre 16 e 29 anos, que são empregadas domésticas – no caso destas faixas etárias, alcança o dobro da proporção das jovens brancas.
As mulheres ocupadas são mais escolarizadas que os homens ocupados; e os brancos mais escolarizados que os negros, sendo que as diferenças raciais neste caso são bastante significativas, o que se explica pela herança de décadas em que os negros não tiveram acesso à escolarização. Contudo, esta não é uma explicação suficiente, uma vez que essas diferenças persistem ao longo do período e também se encontram nas faixas etárias mais jovens. A média de anos de estudo das pessoas ocupadas vem aumentando para todos os grupos ao longo do período estudado. No entanto, a média das mulheres é maior que a dos homens e a dos brancos, maior que a dos negros. No primeiro caso, a distância vem se mantendo ao longo dos anos e, no segundo, pouco se alterou. Com isto, a maior média é a das mulheres brancas da Região Sudeste, com 9,8 anos de estudo – isto é, mais do que o ensino fundamental; e a menor, dos negros do Nordeste, com apenas 5,1 anos de estudo, pouco mais do que a primeira etapa do ensino fundamental, ou antigo primário. Se adicionarmos o recorte etário, chegamos a números impressionantes: os homens negros ocupados com 60 anos ou mais de idade têm em média 2,5 anos de estudo e as mulheres negras na mesma faixa etária, 2,6. Esses números podem ser explicados pela herança de anos de falta de acesso aos bancos escolares por parte da população negra. Resta saber se este segmento populacional não será atingido por políticas públicas que revertam este quadro de poderosa desvantagem em todos os campos da vida.
Referência Bibliográfica
UNIFEM. Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher. Secretaria Especial de Políticas Para as Mulheres. 3ª edição. Brasília. 2008.
Postado por: Isabela Vivas Ferraz Scalco Costa
Nenhum comentário:
Postar um comentário